Thursday, October 05, 2006

Capítulo 3

10 horas. Palmira Ferreira de Menezes chega à entrada do Ritz onde espera ansiosamente por Fernando. Vem bonita, este novo penteado fica-lhe a matar. Saltos bem altos, meias de rede, saia preta e uma camisa justa rosa claro que lhe realça ainda mais os seus fenomenais seios.

Tivera tempo de ir a casa trocar de roupa. Tomou um longo duche de sais relaxantes, retocou a depilação, e aplicou um bom creme hidratante.

O marido de Palmira trabalhava por turnos o que lhe permitia estas escapadinhas. 3 vezes por semana a filha de Palmira passava a noite na casa da avó paterna pois saía muito tarde da esgrima e entrava cedo no colégio. A casa da avó ficava entre o ginásio e o colégio, enquanto que a casa de Palmira ficava a 40 minutos de um e do outro. Era mais prático e seguro assim. Palmira adorava que assim fosse, também.

Vestiu-se, calçou-se, pintou-se discretamente e perfumou-se com o seu novíssimo miracle Intense da Lâncome. Lia-se na embalagem “Lancôme revisita a fragrância de Miracle e cria sob a sua assinatura Miracle Intense: uma re-interpretação mais especiada, mais sensual e mais voluptuosa de Miracle. Uma partida radiosa e especiada de gengibre e de pimenta. ”. Pimenta.....uhmmm....assim iria ser a sua noite...quente!

10 horas. Palmira Ferreira de Menezes chega à entrada do Ritz onde espera ansiosamente por Fernando. “Vem bonita!” pensou Fernando que acabara também de chegar. Com um olhar intenso deu-lhe o combinado sinal que subiriam mal ele fizesse o check-in. Encontraram-se como sempre junto do elevador nºº 1. A partir daquele instante Palmira era de outro homem. Um homem que a fazia sentir-se mulher, desejada, arrojada, sexy.

O sangue começava agora a correr mais quente, mais rápido. A respiração de Palmira estava alterada assim como o batimento do seu coração. A excitação e o desejo começavam a subir-lhe num frenesim exacerbado, mal conseguindo aguentar-se.

Sózinhos no elevador, Fernando ofereceu-lhe 1 rosa que trazia um cartão onde se lia: “Foi o tempo que dedicaste à tua rosa que fez tua rosa tão importante." - Antoine de St. Exupery (in "O princepezinho") ” Após ler o cartão e mesmo sem entender na perfeição aquela mensagem, Palmira sensualmente abraçou Fernando e sem mais palavras beijaram-se.

De repente não existia mais elevador, nem hotel, nem pessoas, nem mundo. De repente eram só aquele beijo mágico. O sangue fervia. Fernando sentia o desejo ardente de arrancar todas as roupas de Palmira . Queria ali mesmo penetrar a bela amante e animalescamente saciar-se. Mas teria de esperar um pouco mais.
Ambos respeitavam o código de boas maneiras e o pudor inibia-os de consumar o acto ali mesmo no elevador nº1.

Plim plim plim

O elevador parou no 10º e último andar do Hotel. Palmira e Fernando apressadamente dão um jeito à roupa desalinhada, não fosse do lado de lá estar alguém que pudesse ficar mal impressionado com aquele desarranjo. De mão dada e olhares cúmplices caminharam vigorosamente para o quarto.

Era um quarto lindissimo. Enorme. Decorado em tons bege e castanho. Dois sofás enormes beges com almofadas decoradas com folhinhas castanhas, o mesmo padrão usado nos dois cadeirões que formavam o U na “sala”. Uma mesinha de apoio ao centro com um candelabro lindíssmo em prata destacava-se pelas altas velas acesas que aqueciam o ambiente. Os cortinados bem abertos permitiam ver o Rio e o Castelo todo iluminado. Que ambiente quente. Que ambiente bom. E que homem quente e bom estava ali com Palmira.

Dois flutes e uma garrafa de MOET & CHANDON - Cuvée Dom Perignon 95 – 150 euros a garrafa – esperavam o casal no quarto. Palmira rejubilou com a ideia de ir beber um champagne tão fino e com tanta classe. Mas Fernando não quis esperar. Lentamente foi desabetoando a camisa de Palmira. Lentamente se foi descobrindo a rendinha branca que finalizava o soutien. Fernando passou a mão e tacteou aquele material macio, mas ele queria sentir a pele de Palmira. Rasgou os últimos botões da camisa de Palmira que explodia já em excitação. Ela quase que tinha vontade de rasgar tudo e num abraço apertado satisfazer ali as suas fantasias e o seu húmido desejo. Aguentou forte, pois aqueles momentos excitantes também lhe davam imenso prazer.

Já sem saia, Fernando contemplou aquele corpo esbelto de mulher que engana a idade que tem.

E ali estava Palmira, exibindo o seu conjunto branco imaculado rendilhado e muito muito sexy, meias de rede e sapatos de salto ainda calçados.

Não aguentaram mais e numa espécie de dança coordenada deixaram-se cair sobre a cama ainda feita. Num acto de luxuria, num acto de paixão louca, mas lenta, os dois corpos dançavam a mesma dança. Uma dança ritmada e conhecida de ambos. Uma dança profunda, de satisfação mútua, de prazer, de explosão.

Palmira não queria que aquele momento acabasse nunca, mas tinha consciência que não podia durar a noite toda, pois teria que regressas a casa e fazer o papel que lhe competia.

A dança terminou com um orgasmo fenomenal, e nada fingido como tinha que fazer em casa com o marido.

Esta noite não houve minetes nem broches, o desejo falou mais altos e outros preliminares tiveram que ficar para outra altura. No entanto, nada disso tinha importância, pois tinha sido uma noite mágica.

Fernando estava especialmente simpático e romântico. Levantou-se subtilmente e foi servir champagne. Trazia um flute em cada mão servido a preceito. Voltou para junto de Palmira, que ainda recuperava o fôlego de tão intensa experiência – talvez a mais intensa vivida até hoje. Brindaram àquela noite e depois um gole saboreado Fernando beijou Palmira e disse-lhe :

” não há nada que me dê mais prazer do que estar contigo, tocar a tua pele sedosa e macia. Nada me traz uma sensação melhor!

Estar contigo, olhar para ti e sentir o teu desejo de estar mais próxima, mais perto, mais colada em mim, faz com que eu me sinta exactamente no Paraíso ou, talvez, mais próximo daquele círculo do inferno de Dante para onde seriam mandados os que pecam por luxúria!!

Tu excitas-me a partir do olhar, excitas-me a cada gesto, consegues excitar-me até mesmo quando pedes que eu observe apenas a maneira charmosa - e um tanto maliciosa! - de te mostrares...

Consegues excitar-me sempre! Até mesmo quando estás a quilómetros de distância, até mesmo quando só estás no meu pensamento!

Excitas-me porque te amo, e porque sei que é muito bom estar na tua companhia, é muito bom poder matar a sede com o teu suor, com a tua saliva, com todos os líquidos abundantes e saborosos que brotam deste teu corpo sensual...
É muito bom matar a minha sede a fazer amor contigo! ”

Palmira arrepiou-se num misto de excitação, contentamento, e de terror. Terror? Porquê de terror?

" Boa tarde, faz favor de dizer."

" Venho dar parte do desaparecimento de uma pessoa."

António fazia-se acompanhar de Joana. A menina vinha chorosa e o pai bastante preocupado.

"O seu nome por favor."

-"António Alfredo Teixeira de Menezes."

por Sara Correia...ainda sans-blogue, à vergonha do seu marido! :)

Friday, June 16, 2006

Capitulo 2

Luís Gustavo Espinosa, pseudónimo literário escolhido por João Matias por achar o nome de baptismo demasiado vulgar e pouco erudito, fixou os olhos no ecrã do computador e releu o penúltimo parágrafo. “E, de vez em quando, ele até lhe fazia um minete.” Minete? Minete, minete… Minete. Não seria demais? Afinal de contas, era o seu primeiro esforço sério para escrever um romance e não queria correr o risco de afastar a devoção potencial de leitores futuros com palavra tão chocante. Minete. E havia ainda a possibilidade seguramente inevitável de os amigos e familiares o lerem e pensarem coisas do diabo a seu respeito. Que era o tipo de pessoa que fazia minetes, por exemplo. Não que houvesse nisso qualquer mal (não se considerava moralista e acreditava ter as ideias tão arejadas como o próximo) mas, pior do que o embaraço pela suposição da prática seria se alguém se mostrasse mais afoito e, em conversa picante, quisesse trocar impressões sobre o assunto. Porque Luís Gustavo (LGE em iniciais cuidadosamente escolhidas pelo método chinês do Feng Shui), aliás João, nunca tinha feito um minete na vida e não fazia ideia de como seria para além da mais básica metodologia. Das duas namoradas que tivera até então, a primeira, Cristina, tinha tido a honra de o estrear nas lides do divertimento horizontal a dois e cada sessão com ela deixava-o de tal forma aterrado que nem se atrevia a mudar de posição durante aqueles catorze segundos intensíssimos. A segunda, a Vanda, apesar do nome óbvio de valdevina, não gostava de exotismos e sempre repelira qualquer tentativa de inovar, conseguindo, mesmo assim, servir-lhe de inspiração para a Palmira da sua estreia como autor. Não por ter mamas fenomenais, que não tinha, por ser casada, que não era, ou sequer por ser dada a mudanças de penteado, mas apenas porque se apresentava ao trabalho na repartição sempre com saia de um negro galáctico (sem estrelas) terminando três dedos abaixo do joelho e camisa imaculada de branco virginal, indumentária que levara os colegas mais maldosos da Repartição de Finanças nº 4382 de Arcozelo a chamar-lhe “a catequista.”

“E, de vez em quando, ele até lhe fazia um minete.” A indecisão mantinha-se. Estava perfeitamente consciente do seu talento e sabia que uma primeira obra devia ser necessariamente marcada por algum arrojo mas até que ponto? Não seria levar a coisa longe demais? Arriscar-se-ia a ser rotulado de pornográfico e a não se livrar do rótulo para o resto da carreira? Arrojo sim mas sem exageros. Afinal, não se tratava de literatura de cordel mas de um romance sério com cabeça, corpo e membros. Ou com capa, lombada e páginas. Qualquer que fosse o paralelismo livresco mais aproximado. Seria o livro que mudaria de uma vez por todas o estatuto e o modo de vida de todos os funcionários de repartição espalhados pelo mundo, gastando o quotidiano numa interminável cruzada contra utentes que teimavam em não perceber que o funcionário estava ali para os servir e que apenas ele sabia qual a melhor maneira de o fazer mesmo que, a olhos leigos, esta pudesse parecer absurda, inútil ou mesmo disparatada. Era uma profissão ingrata e mal vista. E estava na altura de alguém a reabilitar.
Ao mesmo tempo, existiriam laivos de autobiografia. Pedaços embelezados da vida do autor com uma aura mais aventurosa e cativante. A sua carreira académica que, não sendo brilhante, conseguiu alcançar uma mediania ímpar. A infância calma e despreocupada. A sua paixão filatélica. E uma ou outra história ouvida de passagem e que tornaria sua a bem da literatura. Sem esquecer, claro, o momento decisivo que foi a opção pelo desprendimento do funcionalismo público e o seguimento da vocação servil, frustradas as sucessivas ambições de cursar medicina, arquitectura, engenharia agrária ou direito por “falta de méritos escolares,” tinham-lhe dito.

Para apimentar um pouco a coisa, tinha camuflado a sua repartição de finanças em Palácio da Justiça, consciente de que nem todos partilhavam do seu gosto pelos números e pelo preenchimento de formulários e anexos. Até no título já tinha pensado, ainda que apenas de forma provisória. Chamar-se-ia “Servidor Público: Crónicas da Essencial Burocracia” e, dentro da modéstia imposta pelos bons modos, sabia perfeitamente que era um excelente título. Talvez fosse mais do que meramente provisório.

Minete. A palavra parecia destacar-se no ecrã. Algumas linhas antes, tinha falado em mamas e isso já lhe parecia suficiente ousadia. Ainda por cima, tinha-as classificado como “fenomenais,” indicando que o autor não era assexuado e sabia apreciar uma boa mama quando a via. Mas minete?... Raios! E porque não? Minete, pois sim! Minete e mil vezes minete! Era preciso dar a cara pelo que sabia estar certo. O autor era ele e apenas a ele lhe cabia escolher que palavras usar e chocando quem houvesse para chocar. Minete seria. De vez em quando, fazia-lhe um minete e até usava a língua toda. Lambuzava-se e ainda a cobria com creme de mil-folhas e dizia adeus à dieta numa verdadeira orgia pasteleira. Se preciso fosse, ainda ia buscar uma taça de cerejas e usava-as para fins libidinosos e perversos e sem se preocupar com sítio para depositar os caroços. Ninguém tinha nada com isso. O autor tinha decidido e não havia volta a dar-lhe.

Minete. A palavra persistia. Passou os dedos pelo teclado, guardou o trabalho e levantou-se da secretária para procurar um mil-folhas, abandonando um ecrã brilhante e limpo de minetes. “De vez em quando, dava-lhe beijos de tirar o fôlego,” pensara a Palmira.

por Renato Carreira, Inepcia.

Thursday, June 08, 2006

Capitulo 1

Os olhos do Fernando estavam colados ao monte de papéis que estava em cima da sua secretária. Uma petição inicial fresquinha que tinha sido distribuída nesse dia. Involuntariamente, o Fernando sorria, a pensar que ia espremer qualquer coisa a partir daquilo. O sorriso era sobretudo nostálgico, porque hoje em dia aquele esquema já representava muito pouco do seu rendimento. Mas tinha sido por aí que ele tinha começado, e aquilo dava-lhe gozo.

Tinha lido os cerca de trezentos artigos em menos de um quarto de hora. Na diagonal, pois claro, mas tinha sido mais do que o suficiente. O português apresentava-se aos solavancos. Pelo menos três pessoas diferentes tinham trabalhado naquele texto. Mas o conteúdo era de apreensão simples: uma empresa pedia uma indemnização com fundamento num fornecimento de produtos defeituosos. O montante solicitado era elevado, mas o mais importante era a identidade da empresa visada: tratava-se de uma sociedade cotada. Uma óptima oportunidade, portanto. Antes de sair para a rua, para utilizar a cabine telefónica que se encontra em frente à linha dos táxis, o Fernando foi devolver a petição. Porque ela não pertencia à sua vara. Tinha sido um amigo de outra vara que tinha deixado os papéis em cima da sua mesa “para ver se lhe interessava”.

Quando regressou, estava um rapaz novo debruçado sobre o balcão de atendimento. O Fernando ignorou-o e foi sentar-se à sua secretária. Ao sentar, reparou que os seus sapatos estavam sujos. Retirou um lenço de papel de uma gaveta da sua secretária e começou deliberadamente a limpar os sapatos.

Entretanto, o rapaz dizia coisas. Tentava chamar a atenção do Fernando, repetindo que apenas pretendia uma informação. O Fernando perguntou qual era o número do processo e o advogado estagiário respondeu. Sem pestanejar, o Fernando disse que esse processo estava com a juiz.

“Mas, eu só queria saber se a outra parte já se pronunciou em relação ao despacho saneador...”.
“Já lhe disse que o processo está concluso!” rosnou o escrivão. O advogado estagiário começava a desesperar. Não queria acreditar que o energúmeno do funcionário judicial não era capaz de se virar para o olhar directamente enquanto lhe dirigia a palavra.

Fernando Alves, escrivão de direito no Palácio de Justiça de Lisboa, não percebia porque é ele que tinha que aturar este tipo de coisa. Tantos anos de trabalho, uma carreira sindical brilhante, a capacidade de mandar matar uma pessoa através da realização de um simples telefonema, e estar sujeito a isto. Arrependia-se sempre de ficar na secretaria durante a hora do almoço. Parece que todos os dias aparecia um idiota a fazer perguntas e ele não tinha alternativa – era o único que lá estava – se não responder. No entanto, era a única forma que ele tinha de combinar discretamente os seus encontros com a Palmira, escrivão auxiliar de outra vara, e isso compensava o incómodo.

A Palmira, por sua vez, não percebia porque é que eles não comunicavam por e-mail ou por SMS. Mas o Fernando era paranóico. O seu extremo cuidado tinha sido adquirido enquanto Presidente da Direcção Nacional do sindicato. Ele sabia que todo o cuidado era pouco e, como consequência, todas as conversas que mantinha eram presenciais, em lugares públicos.

Mal tinha saído o advogado estagiário, derrotado, e Palmira Ferreira de Menezes entrou de rompante. Sempre trajada de blusa branca e saia preta, hoje vinha com um penteado diferente. Fernando fez questão de não mencionar o novo penteado, em que reparara logo. Com cerca de 40 anos, casada com uma filha, a Palmira tinha umas mamas fenomenais. Hoje, estas esticavam o tecido da blusa.

“Vemo-nos logo à noite?”, perguntou.
“Claro fofinha, às dez na entrada do Ritz?”.
“OK. Jocas!”
“Xau”.

A Palmira não percebia como é que o Fernando tinha dinheiro para pagar quartos em hotéis tão caros. Mas também, não queria saber. O facto é que ele prestava-lhe montes de atenção. Não era muito simpático, mas ela sentia-se mulher quando estava com ele. Desejada. E de vez em quando ele até lhe fazia um minete, coisa que o marida dela nunca tinha feito.

Entretanto, os colegas começaram a voltar do almoço e o Fernando levantou-se para ir almoçar. Saiu do edifício e atravessou a Rua Marquês da Fronteira, subiu as escadas e entrou no Eleven. A abertura daquele restaurante tinha facilitado a vida do escrivão. Era próximo do tribunal e ele nunca corria o risco de se cruzar com algum juiz. Percorreu os olhos pelo “menu express” e decidiu que hoje ia escolher da lista normal.

por Ashitaka, Ougado.